Uma das imagens que jamais sairá da minha mente, quando relembro os tempos tranqüilos de minha infância em Mipibu, é a da subida da Ladeira do Japão, oficialmente Rua Cônego Lustosa, desde sempre, principal via de acesso à cidade.
Entre os anos 60 e 70, por inúmeras vezes, eu, juntamente com meus irmãos Amilton e Hermes, descemos e subimos a antiga ladeira no rumo do Engenho Morgado, propriedade de um primo nosso, o saudoso Renato Peixoto, homem de raríssima inteligência e de postura irretocável.
Os motivos que nos levavam ao velho engenho eram os mais variados. As infindáveis partidas de futebol nas tardes de domingo com os primos, as pescarias de piaba e cará no Rio Mipibu, as colheitas de quase todo tipo de fruta que, por ali, davam com uma fartura impressionante. Ou seja, o lugar era uma paraíso em miniatura, pelo menos era assim que nós considerávamos.
Passados quase quarenta anos, eis que na manhã de hoje eu me dirigi ao lava-jato do Elias, localizado lá no pé da referida ladeira, e, enquanto o carro seria lavado, resolvi fazer uma “leve” caminhada no rumo de casa.
Foi exatamente nesse instante que me deparei com uma imagem bem diferente daquela que estava guardada lá num cantinho da minha memória, a da casa mais emblemática daquela bela rua, a Mercearia de Seu Doca, talvez a mais antiga de São José de Mipibu, ainda em plena atividade.
A Mercearia é, sem sombra de dúvidas, uma referência em nossa cidade. Funciona há mais de meio século e mantém muito bem preservada suas estruturas, graças ao trabalho, o zelo e a determinação de Dona Zezé, viúva de Seu Doca, falecido em 1983.
Quase tudo continua do mesmo jeito. A fachada, o balcão ao velho armário, sem falar em Dona Zezé, indiscutivelmente um patrimônio vivo da história do comércio da nossa cidade.
Nascida em Sapé, estado da Paraíba, Dona Zezé se instalou em São José de Mipibu juntamente com Seu Doca por volta dos anos 50, quando adquiriu de Seu Pedro da Penha o prédio onde funciona até os dias de hoje sua mercearia.
Talvez pela localização e também pela personalidade de Seu Doca, o largo localizado em frente ao prédio, em tempos idos, foi palco por diversas vezes de apresentações de Grupos de Bois de Reis. Essa história me foi contada por Seu Pedro Freire, e, hoje, tive a felicidade de ouvir sua confirmação por Dona Zezé.
Infelizmente vamos falar agora do que, de fato, me motivou a escrever esse texto. A situação de total insegurança vivida pelo mipibuenses, e Dona Zezé é também uma das muitas cidadãs que tem sofrido na pele as conseqüências desse terrível problema.
Sua bela mercearia hoje se encontra toca cercada por grades, inclusive no próprio balcão. O vandalismo e a delinqüência desenfreada enfrentados pelo mipibuenses fizeram com que ela também se cercasse, numa tentativa de proteger seu patrimônio e sua própria vida.
Certa vez ouvi de um poeta que viver é perigoso, mas viver em São José de Mipibu nos dias de hoje é pra lá de perigoso.
É Lamentável essa constatação.
É numa hora dessas que bate a saudade do Engenho Morgado, com sua aura idílica e suave que jamais voltará.
Linda matéria.... Que pena .. como as coisas belas se perdem no tempo não é? as pessoas perdem os verdadeiros valores... E hoje em dia amigo Amauri? Como está por dentro esse lindo morgado? Essa casa raríssima... Desde pequena sempre fui louca e curiosa para ver o que ali havia... rs
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